quarta-feira, 10 de junho de 2009

O universo dos kidults

Veja o que leva um adulto a resgatar os bons momentos da infância incorporando elementos infantis ao seu visual do dia a dia



Por Maria Helena Bellini

Em 2001, no Rio de Janeiro, eles eram conhecidos como Plocs. Tratava-se de uma referência à marca de chiclete, famosa nos anos 1980. Essa tribo formou-se no reduto clubber carioca, ultrapassou as barreiras das raves e saiu às ruas com um visual muito colorido. Embora na Cidade Maravilhosa ainda sejam conhecidos como Plocs, hoje são chamados kidults em outras praiagens, um neologismo que associa as palavras kids e adults (do inglês, crianças e adultos), criado pelo sociólogo britânico da Universidade de Kent, Frank Furedi em artigo de 2003, cujo título é “The children who won’t grow up”.

As passarelas internacionais e as ruas brasileiras tornaram-se palco dessa turma colorida, divertida e bem humorada. Os Plocs tinham como preferência as peças das coleções do estilista Marcelo Sommer, com seus heróis de histórias em quadrinhos e ídolos da música, costumavam fazer caravanas de adeptos aos looks vindas do Rio para adquirir os modelitos do estilista, aqui em São Paulo. Inspirados por essa turma de crescidinhos, que a cada ano ganha mais seguidores, outros estilistas também colocaram em suas coleções temas repletos de referências infantis. Um bom exemplo foi a coleção em homenagem a Zuzu Angel, de 2001, em que Ronaldo Fraga produziu um sapato com pés estampados. “Fiz estampas de nuvens, usei bonecos e pães nos desfiles, enfim, estou sempre brincando com isso em vários elementos. Geralmente, uso muito essa inspiração na estamparia”, comenta o estilista que neste ano levou para a passarela sua coleção Outono-Inverno adulta desfilada também por crianças. Além disso, mostrou bolsas que pareciam uma lousa desenhada a giz e estampas de bolacha Maria.






Já Elisa Chanan ao estrear na Casa de Criadores, em 2004, buscou inspiração no açúcar. Para desenvolver a coleção, ela usou pirulitos e doces. “Acho que ficou mais com essa cara na hora de editar a coleção. Acredito, no entanto, que falei mais do universo lúdico do que de um universo infantil”, justifica. Recentemente, Agatha Ruiz de la Prada levou para o Cibeles Madri Fashion Week 2009 uma coleção bem colorida com elementos infantis. Outra estilista que mostrou o universo kidults nesse mesmo evento foi Marta Montoto e seus pijamas para meninos crescidos que, segundo ela, precisam de carinho em seu sono.

Seja onde for, kidults ou Plocs adoram moda, brinquedos e são fanáticos por acessórios. Bolsas, pulseiras, relógios, porta-jóias, chaveiros, porta-retratos, cadernos, fichários, meias, almofadas e outros itens de marcas infantis como Hello Kitty, Barbie, Meninas Superpoderosas, Piu Piu, Moranguinho, Betty Boop figuram em seu visual como parte complementar do corpo.



Essa turma cheia de nostalgia tem até comunidade no Orkut, com mais de 150 usuários e quatro comunidades dedicadas ao assunto. Também conhecidos como Peter Pans, famoso personagem que vive na Terra do Nunca, lugar onde as crianças não crescem, faz vir à tona a pergunta: por que se comportam desse modo? O que todos querem é se diferenciar, mas a maneira como cada qual escolhe para isso é que muda.

É fácil reconhecê-los: os cabelos em geral são no estilo arco-íris, as unhas têm ''cor de sorvete'' (pistache, goiaba etc), mochilas e bolsas são de personagens de desenho animado e as roupas podem combinar roxo com verde e vermelho. ''Tem gente que me acha infantil demais'', brinca a publicitária Glaucia Romero, 27, fã do universo infantil. ''Só o fato de ser fofinho já me faz comprar algum acessório'', explica. O estilista Sergio Hyke, 25, levou para o seu ambiente de trabalho essa paixão kidult. ''Quem trabalha comigo adora os bonecos que ficam na minha mesa. O Coringa que fica ao lado do meu computador deixa todo mundo maluco perguntando onde eu comprei'', conta. Ele diz que na sua casa tem uma coleção de toy art e elementos desse universo, cujas fotos disponibilizou em seu Orkut.

Para a mestre em psicologia, Dora Lorch, o mundo da moda muda muito e rapidamente, a cada seis meses uma nova coleção é lançada. Por isso, há muita pressão para que idéias inovadoras surjam e, nessa maré elas aparecem e desaparecem na mesma intensidade. “Na busca do novo, do sucesso e de ser notado, vale tudo. Neste cenário, o refresco de lembranças da infância pode ser um bálsamo”, diz.


Dora explica que há pessoas que querem aparecer porque acham divertido a maneira infantil de se trajar. “O problema é a palavra só”, destaca a psicóloga. Se “só” querem se vestir de criança, algo está fora de lugar, e como aconteceu com Peter Pan, questiona-se se há entre os kidults, adultos que não querem crescer. “Se acham divertido aquele ícone, e não levam a sério a indumentária, mas brincam com o estilo pode indicar ousadia e leveza na maneira de ser. Mas se levam a sério e passam até a se comportar como crianças pode configurar um problema”, finaliza Lorch.

Maria Helena Bellini nasceu em Votorantim, interior de São Paulo, morou em Sorocaba e é paulistana de coração desde que mudou-se para São Paulo, lá pelos idos de 1990; é jornalista de uma editora de revistas customizadas e freelancer. Gostaria de ter parido o poema “Balada do amor através das idades”, de Carlos Drummond de Andrade. Contato: mariberllini@hotmail.com

Um comentário:

  1. conhece alguém que se veste como criança? estou fazendo TCC sobre os Kidults. http://migre.me/RMxr Se puderem responder ou encaminhar meu questionário, agradeço mto! Maria Luiza Avanso

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